A variedade é uma característica da Igreja. Com razão, ela é chamada Universal, pois oferece ao ser humano um sentido para as mais diferentes situações da vida, que variam conforme a circunstância. É por isso que, a título de exemplo, o canto litúrgico não é o mesmo durante todo o Ano Litúrgico: advento, natal, quaresma, páscoa e tempo comum têm espiritualidades de fundo diferentes, requerendo assim uma temática própria para cada momento.
Da mesma forma, também a oração – “relação viva dos filhos de Deus com o seu Pai infinitamente bom, com o seu Filho Jesus Cristo e com o Espírito Santo” (Catecismo da Igreja Católica, 2565) – vem permeada de aspectos diferentes em cada etapa de nossa vivência cristã, a partir da motivação de cada tempo litúrgico.
Como, então, definir a oração neste tempo quaresmal? Nosso modelo é o próprio Cristo, que orou em circunstâncias diferentes e de modo peculiar a cada situação. O evangelho de Lucas aponta-nos todas elas: diante de todos (11, 1-2); com os Doze (9, 18-22); com apenas alguns escolhidos (9, 28-36); e, por fim, a sós (11, 1-2). Em determinados momentos, Jesus orava com exultação: “Vos louvo, ó Pai, Senhor do Céu e da Terra” (11,1); em outros, com sofrimento: “Pai, afasta de mim este cálice” (22,42).
O tempo da Quaresma é marcado pela preparação próxima dos que receberão os Sacramentos da Iniciação Cristã: batismo, confirmação e eucaristia; para os já iniciados, é ocasião privilegiada para renovar os compromissos assumidos na fé, acentuando a importância da conversão. Esta, portanto, deve ser a temática central de nossa oração comunitária e pessoal.
A tradição eclesial aponta alguns exercícios de piedade que se foram mostrando eficazes para o crescimento espiritual dos fiéis; o mais conhecido é a via-crúcis, na qual revivemos os passos da Paixão e nos associamos pela meditação a Cristo que entrega sua vida pela humanidade. Também a coroa das Sete Dores de Nossa Senhora é uma belíssima forma popular de refletir sobre a participação da Virgem Maria no mistério da Redenção; São Francisco de Assis compôs o Ofício da Paixão, que coleciona quinze orações inspiradas nos salmos dispostas a santificar, como no Ofício Divino, as diferentes horas do dia na perspectiva do mistério pascal; nessa mesma linha, mais recentemente, a Igreja no Brasil conta com os encontros de reflexão a partir do tema da Campanha da Fraternidade, que ajudam nossa oração quaresmal a estar integrada à realidade da vida.
Os sete Salmos Penitenciais (Sl 6, 31, 37, 50, 101, 129 e 142) representam igualmente um antiquíssimo modo de rezar a partir da Palavra de Deus sob a perspectiva da conversão, além de constituírem um excelente método preparatório para o Sacramento da Reconciliação, suscitando na alma a contrição (arrependimento das faltas causado pelo pesar em se haver ofendido a Deus tão bondoso e misericordioso). Estes salmos podem ser rezados de forma contínua ou alternada nos dias da Quaresma.
Por fim, destacam-se a leitura orante da Bíblia e a oração mental ou meditação cristã, que podem ser baseadas na liturgia diária – bastante propícia para conduzir-nos à mística do tempo quaresmal – ou mesmo na reflexão sobre algum episódio da vida do Senhor (os mistérios dolorosos do Rosário, por exemplo). Do mesmo modo, bons propósitos podem ser estabelecidos durante certos momentos da Quaresma, como a participação na Santa Missa em um ou mais dias na semana, para além do preceito dominical.
Como nosso corpo muitas vezes demonstra nossos estados de ânimo, a postura corporal também pode favorecer a qualidade de nossa oração: assim, rezar tendo diante dos olhos a imagem do Crucificado ou atitudes como a prostração e a genuflexão podem ajudar a manter o foco e a reta intenção de nossa prece.
“Orai sem cessar” (1Ts 5,17), Mais que intensificar a prática da oração, o Apóstolo convida-nos a uma atitude de permanente comunhão com Deus. Busquemos, então, neste tempo favorável, que cada atividade que desenvolvermos – estudo, trabalho, apostolado, lazer… – sejam feitos da melhor forma possível e glorifiquem ao Pai celeste.
Artigo desenvolvido pelo Diácono transitório Vinícius Ferreira Afonso