A Igreja Católica está no período de quaresma. As quaresmeiras floridas de roxo aqui na região recordam-nos a quaresma; período que nada tem a ver com as superstições a seu respeito, muitas das quais ainda perduram. E a quarta feira de cinzas, que abre a quaresma não existe só como purificação das festas do carnaval, mas como sinal de boa vontade em ouvir a Palavra de Deus e praticá-la.
Quaresma são os quarenta dias que precedem a Páscoa: evento da vitória de Jesus, o Filho de Deus, sobre a morte. Jesus passou por esta experiência, ficou quarenta dias no deserto, orando, jejuando, enfrentando as forças misteriosas do mal e vencendo-as, antes de iniciar sua missão (Mt 4,1-11). A quaresma recorda este período, convidando-nos a imitar Jesus na oração, no jejum e na penitência, gestos que ajudam a reorganizar nossa vida interior, reorientando-a para Deus, num processo que a Bíblia chama de conversão.
O termo conversão, pertence à tradição religiosa do judaísmo e do cristianismo. Converter-se é afastar-se daquilo que toma o lugar de Deus em nosso coração (os ídolos). Conversão é condição indispensável para entrar no dinamismo do Reino de Deus, é mudança de mentalidade e de conduta, é sair do pecado que nos torna inimigos de Deus.
O conceito de pecado é rejeitado pela sociedade hodierna, porém, é realidade que aparece em todas as religiões e culturas, com este ou outro nome. A existência do pecado é fruto de uma experiência pessoal e histórica do homem, sinalizado pelo sentimento de culpa que é um dado constante da psicologia humana.
O mal, o “mistério da iniquidade” (cf. 2 Tes 2,7), presente na realidade, ultrapassa qualquer explicação científica. Ele está aí, mesmo quando se nega sua existência, com seu rastro de violência, ódio, divisão, injustiça, causando grande infelicidade e destruição.
Na quaresma a Igreja nos oferece um tema de reflexão que possa nos conduzir à mudança, à conversão. A Campanha da Fraternidade deste ano (CF/2017), tem como tema “Fraternidade: biomas brasileiros e defesa da vida” e o lema: “Cultivar a criação” (Gn 2,15), chamando a atenção para a conservação da natureza, do meio ambiente. Os biomas são áreas especiais, onde a criação se desenvolve de modo particular e harmônico, como por exemplo, a Mata Atlântica, a Caatinga, os Serrados, etc. O tema da Campanha e seu objetivo é levar-nos a refletir, despertando em nós o desejo de encontrar novas formas de relacionamento com a natureza.
Deus colocou o ser humano para cuidar da terra, ser o zelador e jardineiro do planeta, mas infelizmente não é isso que acontece. Em vez de realizar seu papel de colaborador de Deus na obra da criação, o homem substitui-se a Deus, e deste modo, acaba de provocar a revolta da natureza, mais tiranizada que governada por ele.
Que a cor roxa da penitência quaresmal nos recorde o apelo do Senhor Jesus: “Convertei-vos e crede no Evangelho” (Mc 1,15), Evangelho que é salvação e vida para toda a humanidade, e também para a natureza, obra das mãos de Deus.
Artigo escrito por Dom Pedro Carlos Cipollini para o jornal Diário do Grande Abc