Um trágico acontecimento, a morte do jovem Lucas envenenado pelo padrasto, que confessou o crime, chocou neste mês passado (cf. Diário GABC – 23/07/25). Um jovem que segundo depoimento de quem o conhecia, queria ser livre, ter independência e um lar. Este fato, leva a pensar na juventude de nosso país, são milhares que, cheios de sonhos e esperanças, defrontam-se com uma muralha de dificuldades, para não só viver, mas sobreviver, em uma sociedade que parece ter perdido o coração.
Há um conflito de gerações que se manifesta em todos os segmentos da sociedade. De um lado adultos, pretendendo que os jovens reproduzam seus modos de pensar e viver, de outro, jovens convencidos de que só o novo vale a pena. Quando as propostas deixam de dialogar e passam a se opor, o conflito fica dramático. Está presente nas famílias, escolas, ambientes de trabalho e comunidades.
Incompreensão, antipatia, estranhamento, tentativa de dominar e hostilidades são frequentes, na maneira como as gerações mais novas e mais antigas costumam se tratar. O conflito é sempre momento de tensão, o ideal seria viver em harmonia. Porém, considere-se que nem tudo é ruim em um conflito, desde que seja superado, trazendo ganhos a ambas as partes. Como então superar o conflito de gerações?
Em primeiro lugar, considere-se que todos somos filhos e filhas de Deus, pertencemos à família humana, mas cada um é único com sua história original. A nossa impressão digital comprova esta exclusividade. Cada um tem um modo exclusivo de ser, pensar e agir. As diferenças e semelhanças, não devem ser excludentes, mas complementares e são importantes na busca do que é novo e melhor. Assim, a força do conflito se orienta para algo maior. Também o diálogo desarmado, tal como via de mão dupla, na qual se ensina e aprende ajuda a crescer. Todos podem compreender e ensinar.
Um dos espaços mais desafiadores do encontro das gerações é a família: desgastes, discussões, violências verbais e físicas. É preciso respeitar as diferenças, educar um ao outro, valorizar o que é bom, escutar etc. E quando se trata de cristãos, praticar o Evangelho, que ensina a quebrar o círculo vicioso da violência, desprezo, indiferença e viver o amor, o perdão, a paciência e o diálogo. Cada um tem um papel importante numa família onde Deus o colocou.
É através do diálogo e da compreensão que socializamos a riqueza de cada um, seja como indivíduo, como grupo ou como geração. Só assim criamos condições de superar o conflito e fazer com que ele não seja destrutivo, mas construtivo, aproveitando as diferenças para construir um mundo melhor – o Reinado de Deus, ensinado por Jesus Cristo, quem dele participa é “como um pai de família, que tira de seu tesouro coisas novas e velhas “(Mt 13,52).
Na Jornada da Juventude em 2013, no Rio de Janeiro, o Papa Francisco afirmou: “Esta civilização atual nos levou a excluir os dois vértices que são o nosso futuro. Os jovens devem irromper, fazer-se valer; os jovens devem sair para lutar por estes valores; e os idosos devem tomar a palavra e ensinar”. Para o papa, o vigor dos jovens e a sabedoria dos idosos são os grandes presentes que os mais novos e os mais idosos podem trocar entre si para o bem da humanidade.
Em nosso país, a estes conflitos que fazem parte da vida humana, acrescente-se a pobreza e miséria que, muitas vezes, trunca o sonho e os ideais da juventude. Qual a perspectiva de um jovem pobre hoje que não estuda porque tem de trabalhar para comer, e isto quando arruma trabalho? A quantidade de jovens que nem estudam nem trabalham é grande. Falta oportunidade, como se diz, escondendo que a verdadeira falta é de justiça. Basta ver as prisões que estão lotadas de jovens.
Nossa sociedade prefere pagar para manter os jovens na prisão, do que gastar a mesma quantia para dar-lhes educação, trabalho e comida. Será que é por causa desta e outras mazelas sociais, que estamos deixando de ser um país ou sociedade do futuro, para ser uma sociedade não só do passado, mas ultrapassada?
+Dom Pedro Carlos Cipollini
Bispo de Santo André