Observando ao redor, constatamos mudanças e conflitos na sociedade. Acontecem coisas que questionam, abalam as pessoas. Um exemplo é o caso do assassinato de um casal com seu filho, mortos carbonizados. Este assassinato, segundo depoimentos, foi planejado e contou com apoio da filha do casal. As investigações prosseguem.
De onde vem o aumento destes casos? Dramas e tragédias sempre existiram, mas num mundo que atingiu o desenvolvimento que temos, seria para diminuir. Não vivemos em um mundo perfeito, mas no melhor que já existiu ao longo da história. No entanto, nos matamos mais, a depressão aumenta e as mortes provocadas por overdoses matam mais que acidentes de carro. Sem falar dos suicídios que aumentam e da eutanásia que está sendo legislada em alguns países.
O que se busca hoje parece não ser mais a felicidade, mas o prazer físico, a catarse emocional e a estabilidade financeira: é a ditadura da “ética do instante” onde tudo é relativo em uma sociedade “líquida”. Confundem-se os meios com o fim. Ao fazê-lo condenamos nossas vidas ao vazio. Assim, o maior problema da humanidade não é o dinheiro, mas o relacionamento entre os seres humanos.
Fala-se em uma mudança de época e seu nível mais profundo é o cultural: o individualismo reinante enfraquece os vínculos comunitários e propõe uma radical transformação do tempo e do espaço, dando papel primordial à imaginação. A ciência e a técnica, quando colocadas quase que exclusivamente a serviço do lucro, com os critérios únicos da eficácia, da rentabilidade e do lucro, criam uma nova visão da realidade na qual não existe Deus.
E aqui está a causa primordial da crise geral que atravessamos: quem exclui Deus de seu horizonte, falsifica o conceito de realidade e só pode terminar em caminhos equivocados e projetos destrutivos. Não se combate a ideia de Deus hoje, mas vive-se cada vez mais como se Ele não existisse: “Deus é possível, mas não é necessário”, se diz.
Porém, esta situação, na qual para a cultura dominante Deus está ausente, as ideologias morreram, e os valores superiores foram depreciados, nos introduz na “globalização da indiferença”(cf. EG 54).
Nossa cultura atual vê a ciência como a raiz da verdade. Mas a ciência que não tem uma palavra sobre o sentido das causas últimas, não pode substituir a religião. O ser humano se realiza pela “obediência à verdade” (1 Pd 1,22). Mas hoje se perdeu a ideia de uma verdade universal sobre o bem, cognoscível pela razão humana. Mudou também a concepção da consciência, à qual cabe decidir sobre os critérios de bem e de mal. Cada um é lei para si mesmo.
De uma forma simples e lapidar o Papa Francisco escreve: “A crise financeira que atravessamos faz-nos esquecer que, na sua origem, há uma crise antropológica profunda que consiste na negação da primazia do ser humano” (EG 55). Enfatiza ainda que “o ser humano é considerado, em si mesmo, um bem de consumo, que se pode usar e depois jogar fora”.
Ao negar Deus ou ao negar seu lugar na sociedade, se acaba por negar também a dignidade do ser humano. Então, sem Deus o homem não se explica, mas cada vez mais se complica. É a crise geral!
É preciso reagir com uma tomada de consciência que reverta este clima de perda de valores, e mais ainda de sentido, fechando as pessoas sobre si mesmas. É preciso perceber que a crise não é somente econômica, mas uma crise de humanidade, pois o sistema que rege hoje o mundo é objetivamente inumano.