Itaicí – 25 de setembro de 2005 – Ev. Lc 9, 7-9
Dom Pedro Carlos Cipollini
Prezado Dom José Roberto irmãos presbíteros, companheiros de caminhada. É bom estarmos aqui encerrando este retiro tão bem conduzido pelo pregador com sua sabedoria e graça. Nosso Presbitério deu um passo avante, juntos, pela presença de vocês, participação e escuta do que Deus nos falou. Mais que reunidos estivemos unidos. E vamos continuar assim cada vez mais! Agradeço os que estiveram envolvidos na preparação desse retiro.
A nossa situação social está como na época de São João Batista, que aparece no Evangelho aqui proclamado, há uma grande e rápida mudança em curso. Na época de João, o judaísmo tinha se esgotado e o Império Romano dominava com violência. Nessa confusão João Batista anuncia um reinado novo. Preparava os caminhos do Senhor/Messias. Era a voz que clamava no deserto. Quando tudo parecia falido e perdido, foi quando tudo começou!
Hoje também estamos assim, em uma mudança de época e de paradigmas. Um progresso fantástico, mas a humanidade está perdendo sua alma. Rejeita-se Cristo e o Evangelho. A Igreja é suspeita e até perseguida. O homem atrai tudo a si, mas perdeu o seu centro no ativismo e consumismo. A fé ou é distorcida, tanto para a direita como para esquerda, para ser aceira, ou é rejeitada. Estamos em uma grande crise de fé e em meio a indiferença geral. É preciso discernir: a quem eu pertenço? A Deus, a Jesus ou ao projeto de poder, riqueza e bem-estar deste mundo? Herodes quer ver Jesus por curiosidade, e depois, será do grupo que ajudará a matá-lo, como fez com João Batista.
João Batista foi profeta, o último do Antigo Testamento. Ele anunciou um fim e um começo. Hoje, também estamos no entardecer da Igreja, do cristianismo. Depois virá a noite. A Igreja clamará no deserto, será reduzida a pequenos grupos, cheios de fé e de amor. E ouvirá de seu Mestre as palavras confortadoras: “Não temais pequeno rebanho, foi do agrado do Pai dar-vos o Reino” (Lc 12,32). Então quando o mundo estiver cansado e vazio, mergulhado no desespero, aí se voltarão para a Igreja, para as pequenas comunidades que conservaram a fé no Evangelho. A Igreja então florescerá em um maravilhoso amanhecer.
Nós, hoje, estamos no entardecer e devemos cumprir nossa missão neste mundo difícil. Devemos como João Batista preparar os caminhos do Senhor. Manter viva a fé e a profecia. Quando tudo parecer perdido e falido Deus intervirá com vigor na sua obra de salvação! Acontecerão coisas que não esperávamos: surpresas de Deus (o bom ladrão, por exemplo…o centurião… a Ressurreição!).
Qual será a missão do Presbítero neste tempo? O que devemos fazer? Ser profeta! Arauto de Deus. Defensor dos direitos de Deus. É tempo de profetizar. “Não deixe extinguir a profecia”, morreu dizendo Dom Hélder. Existem três dimensões do ministério ordenado: sacerdote, pastor e profeta. Hoje, não se fala muito na profecia, mas ela é mais necessária que nunca, é essencial em todo tempo de entardecer e anoitecer para anunciar a Aurora.
No caos e escuridão de sua época, João Batista anunciava mudança radical: a chegada do Messias. O presbítero será profeta mais com seu testemunho de vida do que com palavras. O mundo, hoje, ouve mais as testemunhas que os discursos. “Colocastes testemunhas/sentinelas vigiando o vosso povo”. O Presbítero profeta deste tempo deverá animar o Povo: “Está escuro, mas eu canto, canto a vitória de Cristo do seu mistério Pascal” (Eucarística).
Estamos diante de uma grande crise de fé. As pessoas deixaram de viver para Deus, vivem para si mesmas. Para nós presbíteros a vida de fé é essencial. É na vida de fé que nos revestimos de Cristo, pois Deus nos quer semelhantes a seu Filho Jesus. Deus quer que Jesus viva em nós e por nós. O Concílio Vaticano II lembra que os sacerdotes são configurados com Cristo para edificarem o corpo da Igreja e por isso devem procurar a perfeição para poderem ser instrumentos vivos de Cristo, na obra da salvação. Cada padre faz às vezes da própria pessoa Cristo. Para isso recebe uma graça especial (graça de estado). “A santidade do presbítero contribui para que seu ministério seja frutuoso. Embora a graça divina possa realizar a obra da salvação também por meio de ministros indignos, diz, contudo, Deus prefere manifestar suas maravilhas através dos que são dóceis ao Espírito Sant e estão unidos a Cristo pela santidade de vida” (Presbyterorum Ordinis nº 12).
Um grande sinal e profecia é a união entre os cristãos. União entre nós padres, principalmente. A profecia, hoje, não é individual, do indivíduo, mas da comunidade, da Igreja. Por isso, devemos insistir nas comunidades: fundá-las, formá-las e cultivá-las.
Esse retiro nos ajudará a articular nossa profecia. Ter vida autêntica, viver primeiramente a paciência conosco mesmo. Não viver de fantasia. Neste sentido exclamava Santa Teresa de Jesus: “Seja o Senhor louvado porque me livrou de mim mesma” (in Livro da Vida, XXIII, 1). Viver com simplicidade e valorizar os pequenos atos de amor!
Este retiro nos ajudará a organizar melhor nossa vida de oração-espiritualidade. Oração é a chave do dia e a chave da noite (Pe. B. Haring). É preciso resgatar a dimensão contemplativa de nossa vida se quisermos cumprir a tarefa de profetizar. Mergulhar na Palavra para que ela tome conta de nós.
Este retiro nos ajudará, a partir da Eucaristia, a beber o cálice que o Senhor bebeu, atravessando o deserto repletos de esperança e ação de graças! Só quem é agradecido pelo que tem, pelo dom da vocação, poderá ser alegre!
Quero terminar lembrando o que disse nosso pregador sobre a humildade: “é virtude que nos faz crescer na santidade”. Não se encontrará nenhuma humilde no inferno e nenhum soberbo no céu!
Humildade para nos aproximar de Deus e termos intimidade com Ele através de Jesus, da oração.
Humildade para nos aproximar dos irmãos do presbitério e termos uma convivência fraterna. Humildade para nos aproximar do Bispo e o Bispo dos padres para confirmar fé e unidade.
Humildade para nos aproximar do povo a fim de estarmos no meio deles como aquele que serve.
Peçamos a humildade para nos converter em profetas do mundo novo, como fez São Carlo Acutis que dizia: “A conversão não é um processo de adição, mas de subtração: menos “eu” para dar mais lugar a Deus.”. Amém