Primeiro bispo da Diocese de Santo André, Dom Jorge Marcos de Oliveira completaria 105 anos de vida neste 10 de novembro de 2020. Nascido no Rio de Janeiro no ano de 1915, deixou um grande legado na região do Grande ABC, como a atuação evangelizadora na sociedade, o caminhar ao lado dos pobres, a obra social Associação Lar Menino Jesus, a luta contra a ditadura, a paixão pela fotografia e a justa homenagem com seu nome no auditório da Cúria Diocesana, no Edifício Santo André Apóstolo.
Sendo conhecido como o “Bispo das Favelas” por sua atuação social e evangelizadora no Rio de Janeiro, Dom Jorge foi nomeado primeiro bispo da Diocese de Santo André no dia 26 de julho de 1954, tomando posse de seu ofício em 12 de setembro na presença do Cardeal Adeodato Giovanni Piazza, secretário da Sagrada Congregação Consistorial. Aqui encontrou uma Igreja local que precisava se estruturar tanto física como pastoralmente. Uma de suas grandes obras sociais que permanece viva até os dias atuais é a Associação Lar Menino Jesus – primeira e mais antiga entidade diocesana desde a fundação da Diocese de Santo André – criada por Dom Jorge no dia 28 de fevereiro de 1956. Já o Centro Comunitário Dom Jorge foi inaugurado em 1972. A unidade oferece diariamente alimentação, atividades socioeducativas e culturais para crianças e adolescentes, de 6 a 15 anos, com ações que complementam o trabalho social com a família e assegurem o direito à convivência comunitária. A obra social permanece firme na caminhada recordando o legado do primeiro bispo diocesano.
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O carisma de um homem acolhedor
De ministra da Eucaristia levando a comunhão aos enfermos a organista nas missas e celebrações especiais, além de atuar na organização de festas litúrgicas na Catedral Nossa Senhora do Carmo, Darci Bombana, 80 anos, sempre teve dedicação à obra de Deus e ao próximo.
Ela se recorda de Dom Jorge como um homem extremamente gentil, acolhedor, alegre e muito comunicativo. “Várias vezes participei de missas que ele celebrava no Lar Menino Jesus, que naquela época ficava onde hoje é a Universidade Federal do ABC. Era muito bonito vê-lo brincando com as crianças que ali eram acolhidas, carregando as menores e se misturando com o grupo todo sempre com um sorriso nos lábios. Era muito amado por aquelas crianças”, revela. Darci também tem na memória um momento memorável de Dom Jorge na cerimônia de entrega de certificados do antigo curso ginasial. “Lá no Colégio Coração de Jesus, quando fez uma brincadeira comigo e o fotógrafo registrou todos rindo. Essa foto me é muito cara e carregada de lembranças felizes”, relembra.
Da Pastoral da Acolhida da Catedral do Carmo, Inês Silva, 66 anos, recorda que Dom Jorge era muito carinhoso e atencioso com as crianças. “Conheci Dom Jorge quando tinha 10 anos. Eu era da Cruzada, entre 1963 e 1964. Me lembro pouco, mas era uma pessoa cativante. Nessa época fazia parte da comunidade Santa Cruz (Região Santo André – Leste). O pároco era o padre José Antônio Cardoso Alves (falecido). Em virtude de minha mãe lavar as roupas dos padres, eu estava sempre na igreja. Muitas vezes fui à cúria antiga buscar hóstia com o Pe. José”, confidencia.
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Atuação marcante no Concílio Vaticano II
Segundo Pe. Felipe Cosme Damião Sobrinho, professor da Faculdade de Teologia Nossa Senhora da Assunção – PUC SP, Dom Jorge sabia entender os problemas do mundo contemporâneo sendo um autêntico profeta.
“Organizou nossa Igreja do ABC de acordo com a renovação eclesial do Concílio Vaticano II (1962-1965). Participou das quatro sessões do Concílio, compreendendo-o como grande sinal de aproximação da Igreja Católica do mundo atual, em vista do diálogo e da paz. Nas atas do Concílio, elaborou quatro contribuições para a elaboração da Constituição Pastoral Gaudium et Spes. Foi um dos quarenta signatários do Pacto das Catacumbas, defendo uma Igreja serva e pobre”, explica o pároco da Paróquia Nossa Senhora da Candelária, em São Caetano.
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Gratidão eterna pelas portas abertas
Atualmente emérito, Pe. Antônio Moura da Silva, 84 anos de idade dos quais 52 como sacerdote, atuou durante 44 anos como pároco da Paróquia Nossa Senhora Auxiliadora, no Parque Capuava, em Santo André. Ele recorda com carinho do acolhimento de Dom Jorge Marcos de Oliveira e o papel essencial em sua ordenação, no ano de 1968. “O que esse homem fez por mim foi impressionante. Me acolheu na Diocese após uma ligação que fiz para ele, em 1965. Tinha feito Filosofia em Aparecida, estava em São Paulo e procurava uma Diocese. É a providência de Deus em nossa vida”, agradece o padre natural da cidade de Aporá, na Bahia.
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Determinado na defesa dos direitos humanos
Estudioso da história da Diocese de Santo André, Pe. Felipe conta que durante os duros anos da Ditadura Militar (1964-1985), Dom Jorge foi perseguido com padres e leigos da Diocese pela sua defesa dos direitos humanos acima de ideologia político-partidárias. “Dom Jorge denunciou a tortura e a perseguição aos Direitos humanos logo no início do Regime Militar. Foi uma voz solitária muitas vezes. Mas não deixou morrer a profecia. Gritou o Evangelho de Cristo com a voz e com a vida, com a poesia e o sofrimento”, constata.
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Um legado social e de esperança para o povo
Pe. Felipe afirma que como bispo emérito, Dom Jorge viveu seu ministério colaborando com Dom Cláudio Hummes, seu sucessor em 1975, e servindo ao povo de Deus. Dedicou seus dias à Associação Lar Menino Jesus e à Capela São José da Vila Assis Brasil em Mauá, hoje paróquia. Sua passagem para a Casa do Pai ocorreu no dia 28 de maio de 1989.
No meio do povo, foi um grande defensor da vida, profeta em tempos difíceis, poeta da esperança. Viveu radicalmente o lema de seu episcopado: “Omnia in Christo”.