O Pai-Nosso que nós rezamos encontra-se no Evangelho de Mateus (6,9-13). Essa versão, mais ampla em comparação à de Lucas (11,1-4), foi utilizada desde os primeiros séculos da Igreja na liturgia e na catequese.
O texto do Pai-Nosso aparece no centro do Sermão da Montanha (Mateus 5,7); constitui, pois, o coração e a síntese do discurso inaugural de Jesus.
Vamos considerá-lo procurando a origem de cada parte
“Pai”: é a tradução da palavra aramaica abbâ. O aramaico era a língua que os judeus falavam no tempo de Jesus. O significado real dessa palavra é “papai”. Trata-se, pois, da palavra que a criança usa quando chama o próprio pai. Jesus mostra, então, que nossa relação com Deus precisa partir da confiança, do amor, do carinho, da mesma forma que uma criança se dirige com tais atitudes ao próprio pai. E como em Deus não há sexo, poderíamos dizer que Deus, ao mesmo tempo, é “papai” e mamãe”.
Ao rezar o Pai-Nosso, ou melhor, o “Papai nosso”, com o coração totalmente confiante, nós começamos a nos “converter e a nos tornar crianças para poder entrar no Reino do Céu” (cf. Mateus 18,3).
“Papai nosso”. Não é somente “papai meu”. Numa língua africana (o kirundi, falada no Burundi), foi traduzido assim: “Pai de todos nós” (Dawe wa twese). Seria suficiente a vivência dessas duas palavras para o mundo inteiro viver na paz. Se Ele, pois, é Pai de todos nós, nós somos irmãos e o mundo vira uma família.
“Que estais no Céu”: a palavra “Céu” indica o Reino de Deus. Ao invocar o “Deus Papai”, expressamos a tensão para o Reino, quando poderemos vê-Lo “face a face” (cf. 1 João 3,2).
Vosso Reino
“Santificado seja o Vosso Nome, venha a nós o Vosso Reino, seja feita a Vossa Vontade, assim na Terra como no Céu”. Trata-se de três pedidos, sendo fundamental o segundo: “Venha a nós o Vosso Reino”. Este Reino vem quando “fazemos a Sua Vontade” e proclamamos, assim, a “santidade do Seu Nome”. A expressão “santificado seja o vosso Nome” aponta para a realização da mensagem do profeta Ezequiel: “Santificarei o meu grande nome” (36,23).
“Assim na Terra como no Céu”: “Céu” é o lugar onde, com a presença de Deus, seu Reino sempre está presente: e nós rezamos pedindo que céu e terra se unam, para que aconteça o Reino de Deus de maneira completa.
Seguem mais três pedidos que correspondem às necessidades do homem
“O Pão-Nosso de cada dia nos dai hoje”: é a necessidade material, mas com uma atitude de confiança e desapego, é a confiança em Deus, que “cuida dos pássaros do céu e dos lírios do campo e muito mais de nós” (cf. Mateus 6,26-30). E a necessidade também do desapego, pois procuramos o “pão”, do qual necessitamos apenas para hoje, sem uma exagerada preocupação para o dia de amanhã (cf. Mateus 6,34).
“Perdoai-nos as nossas ofensas assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido”: é a necessidade espiritual. Trata-se de reconhecer humildemente nossos pecados. Mas o perdão, a misericórdia de Deus, manifesta-se somente se nós somos misericordiosos com o próximo: “como nós perdoamos a quem nos tem ofendido”.
Livrai-nos do mal
“E não nos deixeis cair em tentação, mas livrai-nos do mal”: é a necessidade da Igreja. Aponta, pois, para a tentação dos discípulos diante da Paixão de Jesus; e para a tentação da Igreja, no momento da perseguição. Uma tentação que a Igreja primitiva, época na qual Mateus escreve, conhecia muito bem.
A tentação continua, hoje, pois, como falou recentemente o Papa Francisco, “o envio em missão, por parte de Jesus, não garante aos discípulos o sucesso, assim como não os exime das falências nem dos sofrimentos. Eles devem ter em conta quer a possibilidade da rejeição, quer a da perseguição” (Reflexão na oração do Angelus de 25 de junho de 2017). Este é o “mal” futuro e possível.
Há também o “mal presente”, o espírito do mal que, neste momento, quer nos desviar de Deus. Eis por que muitos biblistas traduzem “livrai-nos do maligno”, em paralelismo com o que Jesus diz numa das parábolas: “vem o maligno e rouba o que foi semeado no coração dele” (Mateus 13,19).
Eis, pois, como é riquíssimo o conteúdo do “Papai nosso”. Vamos penetrar no coração dessa oração, sem a reduzir apenas às palavras vazias, como fazem os pagãos (cf. Mateus 6,7).
Fonte: Canção Nova