“A doutrina e a prática das indulgências na Igreja estão estreitamente ligadas aos efeitos do sacramento da Penitência” (Catecismo da Igreja Católica – CIC, 1471). Por isso, se faz necessário pensar em algumas coisas antes de entrar propriamente no assunto das indulgências. São elas: o pecado, o sacramento da penitência e o purgatório.
“O pecado é ‘uma palavra, um ato ou um desejo, contrários à Lei eterna’ (Santo Agostinho). É uma ofensa a Deus, na desobediência a seu amor. Ele fere a natureza do homem e atenta contra a solidariedade humana. Cristo na sua Paixão desvela plenamente a gravidade do pecado e o vence com a sua misericórdia” (Compêndio do Catecismo da Igreja Católica – CCIC, 392).
Diante dessa realidade do pecado, a Igreja nos oferece o Sacramento da Penitência. Com certeza não abordarei exaustivamente aqui esse assunto, pois ocuparia um artigo específico. A esse respeito, destaco as etapas necessárias para a realização do sacramento. “Um diligente exame de consciência; a contrição (ou arrependimento), que é perfeita quando é motivada pelo amor para com Deus, imperfeita se fundada em outros motivos, e que inclui o propósito de não pecar mais; a confissão, que consiste na acusação dos pecados feita perante o sacerdote; a satisfação, ou seja, o cumprimento de certos atos de penitência que o confessor impõe ao penitente para reparar o dano causado pelo pecado” (CCIC, 303).
“Os efeitos do sacramento da Penitência são: a reconciliação com Deus e, portanto, o perdão dos pecados; a reconciliação com a Igreja; a recuperação do estado de graça, se foi perdido; a remissão da pena eterna merecida por causa dos pecados mortais e, pelo menos em parte, das penas temporais que são consequência do pecado; a paz e a serenidade da consciência, e a consolação do espírito; o crescimento das forças espirituais para o combate cristão” (CCIC, 310).
O que são as penas eterna e temporal? “O pecado grave priva-nos da comunhão com Deus e, consequentemente, nos torna incapazes da vida eterna; esta privação se chama ‘pena eterna’ do pecado. Por outro lado, todo pecado, mesmo venial, acarreta um apego prejudicial às criaturas que exige purificação, quer aqui na terra, quer depois da morte, no estado chamado ‘purgatório’. Esta purificação liberta da chamada ‘pena temporal’ do pecado” (CIC, 1472).
“O purgatório é o estado dos que morrem na amizade de Deus, mas embora certos de sua salvação eterna, têm ainda necessidade de purificação para entrar na bem-aventurança celeste” (CCIC, 210). Como podemos ajudar a purificação das almas do purgatório? “Em virtude da comunhão dos santos, os fiéis ainda peregrinos nesta terra podem ajudar as almas do purgatório, oferecendo por elas orações de sufrágio, em particular o Sacrifício eucarístico, mas também esmolas, indulgências e obras de penitência” (CCIC, 211).
Percorrido todo esse raciocínio, é possível então falar sobre a indulgência. E o que é a indulgência? “Indulgência é a remissão, diante de Deus, da pena temporal devida pelos pecados já perdoados quanto à culpa, que o fiel, devidamente disposto e em certas condições, alcança por meio da Igreja, a qual, como dispensadora da redenção, distribui e aplica, com autoridade, o tesouro das satisfações de Cristo e dos Santos” (Manual das Indulgências, 1).
Existem dois tipos de indulgências. “A indulgência é parcial ou plenária, conforme libera parcial ou totalmente da pena devida pelos pecados” (Manual das Indulgências, 2). “As indulgências, ou parciais ou plenárias, podem sempre aplicar-se aos defuntos por modo de sufrágio” (Manual das Indulgências, 3). No entanto, “qualquer fiel pode lucrar indulgências parciais ou plenárias para si mesmo ou aplicá-las aos defuntos como sufrágio” (Código de Direito Canônico – CDC, cân. 994), nunca, porém, a outra pessoa viva.
Quais são as condições para se receber as indulgências? “Para que alguém seja capaz de lucrar indulgências, deve ser batizado, não estar excomungado e encontrar-se em estado de graça, pelo menos no fim das obras prescritas. Para que a pessoa lucre de fato as indulgências, deve ter a intenção, pelo menos geral, de as adquirir, e deve cumprir os atos prescritivos no tempo estabelecido e no modo devido, segundo o teor da concessão” (CDC, cân. 996, § 1-2).
Qual é a regra geral para lucrar uma indulgência? “Para adquirir a indulgência plenária é preciso fazer uma obra enriquecida de indulgência e preencher as seguintes três condições: confissão sacramental, comunhão eucarística e oração nas intenções do Sumo Pontífice. Requer-se além disso rejeitar todo o apego ao pecado, qualquer que seja, mesmo venial. As três condições podem ser preenchidas em dias diversos, antes ou após a realização da obra prescrita; mas convém que a comunhão e a oração nas intenções do Soberano Pontífice se façam no mesmo dia em que se faz a obra” (Manual das Indulgências, 7-8). “A condição da oração nas intenções do Sumo Pontífice pode ser plenamente cumprida recitando em suas intenções um Pai-nosso e Ave-Maria; mas é facultado a todos os fiéis recitarem qualquer outra oração conforme sua piedade e devoção para com o Pontífice Romano” (Manual das Indulgências, 10).
São muitas as concessões de indulgências, algumas tendo como pressupostos exercícios cristãos da vida cotidiana, outras com datas determinadas sempre relacionadas a alguma solenidade litúrgica, outras em ocasiões extraordinárias. Para se ter um conhecimento completo de cada uma dessas concessões, é interessante ter acesso ao Manual das Indulgências. As indulgências são muito mais do que um exercício de piedade cristã, mas acima de tudo é um caminho de conversão e santificação, por meio do qual nossa alma e nosso corpo vão se conformando a Cristo Senhor que se ofereceu na cruz pela nossa salvação. Elas são um tesouro da misericórdia divina, porque nos permitem lutar contra as consequências do pecado a que chamamos de penas temporais, que aos poucos vão manchando nossa alma e nos afastando do amor infinito de Deus.
* Artigo por Rafael Ferreira de Melo Brito da Silva