Hoje em dia, parece que a mentira está na moda. São muitos os que se servem dela, em especial, parte de nossos políticos. Muito se investe nela, apesar do ditado dizer que a mentira tem pernas curtas. Embora tenha existido sempre, também foi sempre condenada. Plutarco, historiador da antiguidade helênica deixou escrito: “Os mentirosos são a origem de todos os crimes que assolam a terra”. Já na Bíblia se pode ler: “O Senhor abomina os lábios mentirosos e se compraz nos que agem com sinceridade” (Provérbios 12,22).
A mentira adquire forma na palavra. Não só na palavra falada, mas também na que se expressa em qualquer tipo de comunicação pelo ser humano, como esta que estamos usando aqui, a escrita. Onde o que se manifesta não é sinal efetivo e autêntico, porém, distorcido e desviado do verdadeiro, existe uma mentira, que assume a forma do engano, da ficção ou da hipocrisia.
Jesus sempre manso e humilde de coração é duro com os mentirosos. Ele diz que os mentirosos são filhos do diabo o qual “é homicida desde o princípio, e não permaneceu na verdade, porque a verdade não está nele; quando ele diz a mentira, fala do que lhe é próprio, porque é mentiroso, e pai da mentira” (Jo 8,44). Ao longo da história, todos os regimes políticos autoritários, ditatoriais, violentos e populistas usam a mentira como estratégia de dominação da população. Algo diabólico!
Na consciência dos valores constituídos, tanto da pessoa humana como da sociedade, o sujeito ético reconhece e afirma a verdade como um bem originário, decisivo e imprescindível para a construção de uma sociedade sadia. Uma sociedade somente pode ser livre se for fundada na verdade. Não somente a verdade tida como um bem ético ou conceito filosófico, mas a verdade dos fatos, a clara visão da realidade. A veracidade é um dever ético, dever de todo cidadão em vista de uma sociedade mais justa e solidária.
Somente a verdade permite o dinamismo criador que faz avançar a sociedade rumo ao progresso. Toda mentira é sempre “auto engano”, que separa a pessoa de si mesma. A mentira trai a confiança dos interlocutores e impossibilita a comunicação construtiva, pois na comunicação mentirosa, a palavra não está a serviço da verdade, mas do interesse de quem mente.
A mentira, embora dita por um indivíduo, possui também uma dimensão coletiva e pública, a qual se expande com a extensão das comunicações sociais ligadas ao poder em todas as formas. Informação hoje é poder. Por si mesma, a comunicação é exercida como serviço à verdade em benefício da sociedade. Contudo, existe a tentação de se veicular uma visão interesseira, adulterada da verdade, que em si é uma mentira.
Peço licença aos leitores de transcrever aqui trecho de um escrito de grande jurista baiano, Rui Barbosa: “Os antigos enxergaram no mentiroso o mal vil dos tarados morais. Depois de enumerar todas as misérias de um perdido, concluíam, quanto cabia: e mente’… O ladrão prostitui a própria boca, a sua palavra e a sua consciência. O ladrão ofende o próximo nos bens da fortuna. O mentiroso não é no patrimônio, é na honra, na liberdade, na própria vida. Do ladrão nos livra o cadeado, o apito do guarda. Do mentiroso nada nos livra, porque o enredo, a invencionice, volatilizados no ar, depois de tramados são impalpáveis como os germes das grades epidemias”.
Podemos concluir que o maior castigo do mentiroso é não ser acreditado quando fala a verdade, além de ser colocado no lixo da história, quando vier a faltar.
* Artigo por Dom Pedro Carlos Cipollini, Bispo da Diocese de Santo André