Missa em Ação de Graças pelos 7 anos de instalação do Tribunal Eclesiástico Diocese de Santo André – 28/11/2024 – Catedral Diocesana
Leitura: Dn 2,31-45
Salmo: Dn 3,57-59.60-61 (R. 59b)
Evangelho: Lc 21, 5-11
HOMILIA
Caros irmãos e irmãs, minha saudação a todos em especial aos membros do Tribunal Eclesiástico Diocesano, nesta data significativa que marca a consolidação desta instituição de nossa Igreja Particular a serviço da justiça e da vida plena para todos.
É neste contexto que a Palavra de Deus nos pede para abrir caminho em nossos corações a fim de compreendermos a justiça do Reino e quem é seu Rei: Jesus.
A imagem da primeira leitura (Dn 2,31-45), fortemente simbólica como é próprio do estilo apocalíptico, tem uma mensagem que precisamos captar, para percebermos o seu significado último.
O livro de Daniel foi composto no tempo do Rei Antíoco IV, quando o povo estava reduzido a quase nada, oprimido, sem esperança. Os Hebreus fervorosos aprofundaram a sua fé, refletindo a sorte dos povos que os tinham dominado anteriormente, Medos, Persas, Gregos, reinos poderosos, que desapareceram uns depois dos outros. O mesmo haveria de suceder ao Rei Antíoco.
Uma «pedra» havia de desprender-se da montanha, para reduzir a cacos a estátua. Nesta pedra, desprendida da montanha, «sem intervenção de mão alguma» (v. 34), reconhecemos Cristo, nascido da Virgem Maria, sem pai terreno, que veio proclamar e a estabelecer o seu Reino com a vitória sobre o mal e a morte.
O Reino de Deus é muito diferente do reino dos homens. Apresenta-se na humildade, estabelece-se nos corações e transforma-os sem clamor, com um poder enorme, mas secreto.
Acontece-nos, muitas vezes, desejarmos um reino mais visível e triunfal. Mas é um sonho a que temos de renunciar. Deus prefere agir no silêncio e no escondimento. O importante é acolhermos o Reino em nós, nas nossas famílias, nas nossas comunidades, na Igreja. Jesus avisa-nos: «Tende cuidado em não vos deixardes enganar» (v. 8).
De fato, também hoje, há pessoas que propõem coisas extraordinárias. «Não vos alarmeis», alerta-nos Jesus (v. 8). Tudo o que acontece é humano. O Reino é uma realidade eterna. Quando nos sentimos oprimidos por diversos «impérios», externos ou internos a nós mesmos, aprofundemos a nossa fé no Rei que não falha, no Rei forte, perante o Qual todos os outros poderes são reduzidos a nada.
«Verificamos que o mundo de hoje se agita num imenso esforço de libertação: libertação de tudo quanto lesa a dignidade do homem e ameaça a realização das suas mais profundas aspirações: a verdade, a justiça, o amor, a liberdade (cf. GS 26-27) … Nestas interrogações e procuras entrevemos a expectativa de uma resposta que os homens esperam, mesmo sem chegar a formulá-la claramente.
Podemos perceber que o fim do mundo e a vida futura marcam a espiritualidade cristã. É o que São Lucas no Evangelho nos indica ao referir mais um “Discurso escatológico” de Jesus (Lc 21, 5-11). As perguntas que os ouvintes fazem a Jesus – «Mestre, quando sucederá isso? E qual será o sinal de que estas coisas estão para acontecer?» – são duas pistas para investigarmos a mensagem.
O discurso de Jesus é pronunciado diante do templo, com as suas «belas pedras» e «ofertas votivas», o que cria contraste entre o presente, que ameaça fechar a religiosidade dos contemporâneos de Jesus, e o futuro para onde Jesus deseja orientar a fé dos seus ouvintes.
Ao responder, Jesus anuncia o fim do templo e, de certo modo, de tudo aquilo que ele simboliza. Anuncia o fim do mundo que se concretizará nessa catástrofe e em tantas outras. Tudo o que é deste mundo terá certamente fim, mais tarde ou mais cedo. Por isso, o mais importante é acolhermos o ensinamento de Jesus e deixar-nos guiar por ele, entrar no dinamismo do Reino de Deus, enquanto aguardamos a sua vinda. A palavra de Jesus ajudar-nos-á a discernir pessoas e acontecimentos, e a optar pelos valores que Ele nos propõe.
Há muita gente que anuncia a proximidade do fim do mundo, para nos aterrorizar, e nos oferece caminhos de salvação. Jesus não faz isso. Mesmo quando fala do fim do mundo, preocupa-se em iluminar-nos e em confortar-nos.
Jesus é o Rei dos reis. “Todos os reis da terra o hão de O adorar e todos os povos o hão de O servir». Nada está mais bem marcado no Antigo e no Novo Testamento do que a realeza de Jesus.
O que o AT dizia de Deus, que é o Rei dos reis e o Senhor dos senhores (Dt 10), o Apocalipse di-lo várias vezes de Cristo. «O cordeiro triunfará sobre todos os reis, porque ele é o Senhor e o Rei de todos os que reinam» (Ap 17,14).
Todo o salmo 2 (responsorial) é o cântico de glória da realeza de Cristo: «Os reis lutarão em vão contra ele. Deus disse-lhe: pede-me todas as nações em herança e eu te darei, tu reinarás sobre todos os reis». São Paulo diz aos Colossenses: «Cristo é o chefe de todo o principado e de toda a potestade» (2,10).
Este Reino pode encontrar dificuldades e provas, mas Cristo triunfará sempre. «É em vão, diz David, que os reis e os povos conspiram contra Deus e o seu Ungido, o Rei dos reis há de vencer e seu Reino não terá fim. E nós venceremos com Ele se ouvirmos sua Palavra e colocarmos em prática.
Nesta perspectiva do Reino de Deus, é que se insere o Tribunal Eclesiástico Diocesano que a nível interno da Igreja existe para favorecer a comunhão eclesial. É missão do Tribunal ajudar a fazer justiça, tirando os empecilhos à comunhão. Por isso, a tônica do Tribunal é pastoral por mais que trabalhe com o aspecto jurídico como meio e método, a finalidade é pastoral.
E a finalidade da pastoral é fazer com que Cristo reine e seja tudo em todos como diz o apóstolo São Paulo, o que se traduz em termos jurídicos como “salvação das almas” (salus animarum) o máximo escopo das leis eclesiásticas.
Parabéns aos que trabalham no nosso Tribunal em especial ao Pe. Jean Rafael Eugênio Barros, Vigário Judicial. Deus abençoe a todos.
Dom Pedro Carlos Cipollini
Bispo de Santo André